Exceção de Pré-Executividade: Guia para Empresas se Defenderem em Execuções Fiscais e Cíveis
- Andressa Thomé
- 14 de fev.
- 7 min de leitura
Atualizado: 26 de fev.
A execução fiscal e a execução civil de títulos extrajudiciais fazem parte da realidade de empresas e empresários e podem trazer grandes desafios. Dívidas tributárias, contratos não cumpridos, notas promissórias, entre outras situações podem levar a processos de execução que, se não forem bem conduzidos, podem comprometer seriamente o patrimônio e a saúde financeira de um negócio.
Diante desse cenário, é fundamental que empresários, gestores e profissionais da área jurídica conheçam as ferramentas de defesa disponíveis para proteger os interesses da empresa. Uma dessas ferramentas, muitas vezes negligenciada, mas extremamente poderosa, é a exceção de pré-executividade.
Este artigo tem como objetivo fornecer um guia prático e completo sobre a exceção de pré-executividade, abordando seus conceitos, requisitos, procedimento e aplicação tanto em execuções fiscais quanto em execuções cíveis de títulos extrajudiciais
Ao final da leitura, você terá um entendimento sólido sobre como utilizar essa importante ferramenta de defesa para proteger sua empresa.
1. O que é Exceção de Pré-Executividade?
A exceção de pré-executividade é um meio de defesa incidental que permite ao executado (a empresa que está sendo cobrada judicialmente) alegar determinadas matérias dentro do próprio processo de execução, sem a necessidade de oferecer garantia do juízo (penhora, depósito, caução) ou de propor uma ação autônoma, como os embargos à execução.
Em outras palavras, é uma forma de a empresa se defender diretamente nos autos da execução, muitas vezes “congelando” a execução até a sua apreciação, apresentando uma simples petição ao juiz e demonstrando, de plano, que a execução é indevida ou que existem vícios graves que a impedem de prosseguir.
É importante diferenciar a exceção de pré-executividade de outros meios de defesa:
Embargos à Execução: É uma ação autônoma, com procedimento próprio, que exige, em regra, a garantia do juízo (na execução fiscal, essa exigência é expressa no art. 16 da Lei 6.830/80 – LEF). Esse meio de defesa pode ou não suspender a Ação de Execução.
Impugnação ao Cumprimento de Sentença: É o meio de defesa cabível nas execuções de títulos judiciais (sentenças), com procedimento e prazos específicos.
A exceção de pré-executividade, por sua vez, não tem previsão legal expressa no Código de Processo Civil (CPC) ou na Lei de Execução Fiscal (LEF). Trata-se de uma criação doutrinária e jurisprudencial, amplamente aceita pelos tribunais, que visa garantir o direito de defesa do executado e evitar execuções injustas.
A base para a criação desse instituto remonta a um parecer do ilustre doutrinador Pontes de Miranda, de 1966, que defendia a possibilidade de o executado alegar a não executividade do título diretamente nos autos da execução. Essa ideia foi sendo desenvolvida e aprimorada pela doutrina e jurisprudência, culminando na consagração da exceção de pré-executividade como a conhecemos hoje.
2. Quando a Exceção de Pré-Executividade é Cabível?
A exceção de pré-executividade não é um "remédio para todos os males". Seu cabimento é restrito a determinadas matérias, que podem ser divididas em dois grandes grupos de requisitos, cumulativos, conforme súmula nº 393 do Superior Tribunal de Justiça:
A exceção de pré-executividade é admissível na execução fiscal relativamente às matérias conhecíveis de ofício que não demandem dilação probatória. (SÚMULA 393, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 23/09/2009, DJe 07/10/2009) |
Grupo 1
Matérias de Ordem Pública, são aquelas que o juiz deve conhecer de ofício, ou seja, independentemente de provocação da parte. Incluem, os pressupostos processuais, requisitos para a existência e validade do processo (ex: competência do juízo, capacidade das partes, regularidade da citação); condições da ação, requisitos para o exercício do direito de ação (ex: legitimidade das partes, interesse de agir); e nulidades que correspondem a vícios processuais graves.
Grupo 2
Matérias que podem ser comprovadas de plano são aquelas que podem ser demonstradas por prova documental pré-constituída, ou seja, documentos que já existem e que são apresentados junto com a petição da exceção de pré-executividade. Não é admitida dilação probatória (produção de outras provas, como perícia ou oitiva de testemunhas).
Exemplos práticos de cabimento em execuções fiscais e cíveis:
● Ilegitimidade passiva da empresa: A empresa não é a devedora da dívida ou não é a responsável pelo seu pagamento.
● Nulidade da citação: A empresa não foi citada corretamente no processo de execução.
● Inexistência ou nulidade do título executivo: O título que embasa a execução não existe, é falso ou não preenche os requisitos legais.
● Excesso de execução: O valor cobrado é superior ao devido.
● Pagamento: A dívida já foi paga (total ou parcialmente), e a empresa possui o comprovante.
● Prescrição ou decadência: O direito de cobrar a dívida já se extinguiu pelo decurso do tempo.
É fundamental ressaltar que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) exige que a matéria seja de ordem pública para que seja cabível a exceção de pré-executividade, in verbis:
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. DECISÃO QUE NÃO CONHECEU DO RECURSO ESPECIAL. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. EXCLUSÃO DO ICMS DA BASE DE CÁLCULO DO PIS/COFINS. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. SÚMULA 7/STJ. PRECEDENTES. AGRAVO INTERNO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
1. Consoante enunciado da Súmula 393/STJ, a exceção de pré-executividade é admissível na execução fiscal relativamente às matérias conhecíveis de ofício, que não demandem dilação probatória.
2. A análise do excesso de execução decorrente da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS/COFINS, ao impugnar o título executivo, excede os limites da via escolhida, de exceção de pré-executividade, pois demanda dilação probatória. Nesse sentido: AgInt no REsp 2.051.709/SP, relator Ministro Mauro Campbell Marques; AgInt no AREsp 1.775.722/SE, relator Ministro Herman Benjamin; AgInt no AREsp 1.850.316/RS, relator Ministro Mauro Campbell Marques; AgInt no REsp 1.885.901/SC, relator Ministro Gurgel de Faria; AgInt no AREsp 1.775.722/SE, relator Ministro Herman Benjamin.
3. A revisão da premissa fática assentada no julgado, pressupõe, no caso, reexame de prova, o que é inviável no âmbito do recurso especial, nos termos do Enunciado 7/STJ.
4. Deve ser negado provimento ao agravo interno, quando não apresentados pela parte agravante argumentos novos capazes de infirmar os fundamentos que alicerçaram a decisão agravada.
5. Agravo interno conhecido e não provido
AgInt no AREsp 2185170(ACÓRDÃO)Ministro AFRÂNIO VILELADJe 02/04/2024 Decisão: 19/03/2024
Outra questão relevante é que, diferentemente dos embargos à execução e da impugnação, a exceção de pré-executividade não tem prazo. Ela pode ser apresentada a qualquer momento, enquanto durar o processo de execução. Isso significa dizer que mesmo que a empresa tenha perdido algum prazo processual, há a possibilidade de enfrentar a execução com esse meio de defesa, caso preencha os requisitos já apresentados para sua admissão.
3. Exceção de Pré-Executividade e o Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica
O incidente de desconsideração da personalidade jurídica é um procedimento que permite que os sócios ou administradores de uma empresa sejam responsabilizados por dívidas da pessoa jurídica, em casos de abuso da personalidade jurídica (desvio de finalidade ou confusão patrimonial).
A exceção de pré-executividade pode ser utilizada para questionar a regularidade do incidente de desconsideração, como, por exemplo, a falta de citação dos sócios ou a ausência de demonstração dos requisitos legais para a desconsideração. No entanto, a discussão sobre o mérito da desconsideração (se houve ou não abuso da personalidade jurídica) geralmente exigirá dilação probatória, o que torna a exceção de pré-executividade inadequada.
4. Exceção de Pré-Executividade e a Recuperação Judicial
A recuperação judicial é um processo que visa permitir que uma empresa em dificuldades financeiras se reorganize e continue suas atividades. A decretação da recuperação judicial suspende as execuções contra a empresa, mas essa suspensão não é automática e nem definitiva.
A exceção de pré-executividade pode ser utilizada para, por exemplo, demonstrar que já houve o pagamento da dívida executada.
5. Exceção de Pré-Executividade na Execução Fiscal
A exceção de pré-executividade é amplamente utilizada nas execuções fiscais (cobrança de dívidas tributárias). A Súmula 393 do STJ estabelece:
"A exceção de pré-executividade é admissível na execução fiscal relativamente às matérias conhecíveis de ofício que não demandem dilação probatória."
O STJ tem admitido a exceção em execuções fiscais para discutir diversas questões, desde que comprovadas de plano, como:
● Ilegitimidade passiva do sócio (quando o nome dele não consta na CDA).
● Nulidade da CDA (ausência de requisitos legais).
● Prescrição e decadência.
● Pagamento (comprovado documentalmente).
● Excesso de execução.
Um ponto importante a ser discutido é a garantia do juízo na execução fiscal. A Lei de Execução Fiscal (LEF - Lei 6.830/80) exige, em seu art. 16, § 1º, a garantia do juízo (penhora, depósito, caução) como requisito para a apresentação dos embargos à execução.
No entanto, a jurisprudência do STJ tem mitigado essa exigência em casos de hipossuficiência do executado. Se a empresa comprovar que não tem condições de garantir o juízo, o STJ tem admitido a apresentação dos embargos sem a garantia.
Porém, mesmo para casos em que não haja hipossuficiência, a Exceção de Pré-executividade não exige a garantia para que possa ser apresentada.
6. Exceção de Pré-Executividade: Uma Ferramenta Poderosa, Mas com Limites
Afinal, exceção de pré-executividade é uma ferramenta poderosa para defender sua empresa, mas é preciso usá-la com estratégia e cuidado. Ela não é um "salvo-conduto" para qualquer tipo de defesa, e seu uso inadequado pode prejudicar a empresa.
A exceção de pré-executividade é uma ferramenta essencial para a defesa das empresas em execuções fiscais e cíveis. Por permitir que a empresa questione a execução de forma rápida, simples e sem a necessidade de garantia do juízo.
No entanto, é fundamental que a empresa conheça os requisitos e limites da exceção, para utilizá-la de forma estratégica e evitar a preclusão de questões importantes.
Este artigo buscou fornecer um guia prático sobre a exceção de pré-executividade, abordando seus aspectos teóricos e práticos.
Recomendamos que as empresas busquem assessoria jurídica especializada para analisar a viabilidade da exceção em cada caso concreto e garantir a melhor defesa de seus interesses.
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Andressa Thomé - OAB/BA 80.377
Enriquecedor, estava em dúvida quanto a possibilidade de apresentar tal defesa..